20040427

Minha vida, Meus amigos, Minha vida

É impressionante como muitas vezes nos pegamos queimando neurônios com questões existenciais.
Decidi falar um pouco sobre mim mesmo nesse post pois senti a necessidade de tal.
Para isso, vamos começar com uma parte de mim que, apesar de ter ocorrido a muito tempo atrás, se nega a deixar de existir, a Infância.
Então leitores, preparem-se para um longo texto. Sentem-se, peguem suas pipocas, coloquem o som de seu agrado (preferencialmente Rock & Roll), mas se vocês colocarem samba, sertanejo, pagode, axé ou funk serão amaldiçoados pelo resto de suas vidas (mortais, imortais ou do além)

  1. Infância

  2. Minha infância foi um tanto quanto conturbada.
    Eu tinha um problema de excesso de produção de cerume nos ouvidos, o que me impossibilitava de participar do mundo como os adultos (em especial, como os professores e a diretora da escola pré primária em que estudava) queriam, pois como ouvia mal não tinha como fornecer a atenção desejada.
    Meus pais me levaram em diversos médicos, dos quais a grande maioria dizia ser um sintoma autista, porém apenas um conseguiu detectar o problema antes que fosse tarde demais (e eu perdesse completamente minhas capacidades auditivas).
    Esse problema tomou parte importante de minha vida e acredito que em parte devido a ele os eventos a seguir tiveram efeito.
    Como ouvia mal (em especial apenas quando eu estava prestando atenção) eu me dedicava ferrenhamente à primeira tarefa que me era incumbida e quando os professores decidiam mudar a tarefa a ser realizada eu estava tão absorto na conclusão da primeira que não executava a segunda.
    Assim surgiu o primeiro estigma da minha vida, eu, um garoto "excepcional" (pelo menos até resolver o problema nos meus ouvidos).
    Devido a isso eu ganhei um defeito (ou uma vantagem), uma desórdem ou déficit de atenção (ADD), que trago comigo até os dias atuais (falarei sobre isso mais à frente).
    Como prestava muita atenção devido ao ADD, desenvolvi uma capacidade de aprendizado e memorização impressionantes, as quais eu comecei a praticar logo quando ingressei no ensino básico, ou seja, na primeira série.
    Enquanto os professores exigiam que os alunos copiassem em seus cadernos o que eles escreviam na lousa eu me mantinha absorto nas informações que eles passavam, tentando inferir logicamente (naquela época não sabia o que era inferir, tampouco que essa palavra existia) sobre o conhecimento adquirido e o deduzido gerando, assim novos conhecimentos (que seriam aplicados algumas aulas adiante). Aprendia mais rápido que os outros alunos, pois não me limitava apenas a receber informações, mas sim a também raciocinar sobre ela.
    Como meu caderno sempre estava incompleto os professores (e também meus colegas) colocaram o meu segundo estigma (uma vez que o primeiro já havia sido eliminado). Eu era o aluno lerdo da classe, aquele incapaz de acompanhar a turma (embora minhas notas sempre fossem as melhores), transformando-me no bode expiatório e saco de pancada dos alunos fanfarrões, além de motivo de piadas pelos outros "colegas".
    Foi quando ganhei meu primeiro (e único) video-game, o qual me fez interessar pela computação alguns meses mais tarde quando descobri (inferi) que os jogos que vinham nos cartuchos nada mais eram que programas de computador.
    Desnecessário dizer que não tinha amigos reais, apesar de sempre tentar fazer amizades ou firmá-las nada adiantava e o resultado final era eu, um rapaz franzino na época e extremamente pacifista, machucado, arranhado, contundido quando chegava em casa.
    Diversas tentativas foram feitas pelos meus pais me colocando em aulinhas de futebol de salão ou outras coisas, mas, como em toda cidade pequena, todos conhecem todos e essas tentativas para que eu tivesse uma vida infantil saudável foram praticamente em vão.
    Aos oito anos ganhei meu primeiro computador, um MSX da Gradiente, comecei a ter aulas de programação e me enfurnei na vida tecnológica até meus 13 anos de Idade, quando comecei a sair para a vida noturna.
    Como não tinha amigos (na verdade, até os 13 meu único amigo era meu computador) tinha que descarregar minhas energias de alguma forma e o que me proporcionou isso foi um estilo de música que vim a tomar conhecimento aos oito anos de idade, em 1985, através de diversos comerciais de TV que anunciavam bandas como KISS, Iron Maiden, Scorpion, AC/DC, dentre outros. Sim, comecei a ouvir Roc & Roll, meu estilo favorito até hoje e fundamental para a minha existência/felicidade.
    Devo a essa minha atitude, de querer estudar programação ou computação por si só, por ter essa capacidade de raciocínio que tenho hoje. Se seguisse os padrões que a escola me exigia eu seria apenas mais um dentre muitos dos meus ex-colegas medíocres.

  3. Adolescência (ou, porquê fui tão chato)

  4. Quando não se tem amigos na infância para se divertir como uma criança deveria a gente busca outras formas de diversão. A minha foi o estudo de informática e, com isso, cresceu um sentimento de responsabilidade, além de uma vontade extrema de ser respeitado e reconhecido, algo que, na época, para a área de informática, era impossível, pois éramos tidos como o NERD padrão, aquele que não tem e nem se interessa por vida social (o que não ocorria comigo).
    Assim foi minha adolescência, conturbada, pois os pais ainda tem responsabilidade sobre nós, mas eu queria minha liberdade e meu respeito.
    Nessa época comecei a ter a minha vida noturna. Lembro-me que minhas primeiras "saídas" foi com um colega de crisma (sim, sou batizado, catequizado e crismado pela igreja católica por força de vontade de meus pais, embora hoje em dia eu não aceite os dogmas da mesma justamente por não ser apenas um receptor de informações).
    Alguns meses depois reencontrei um ex-colega de quando fazia aulas de futebol de salão (o qual deixei de fazer por ser extremamente ruim em esportes).
    Firmamos uma amizade e através dele conheci os malucos que gostavam de Rock. Sim, malucos, ladrões, drogados. Todos os estigmas que existiam para quem gostava de Rock na década de 80 em uma cidade pequena. Todos vindo de uma classe social que era (e ainda é) desprezada ou esquecida pelos padrões da sociedade atual.
    Através deles comecei a ter uma vida noturna mais intensa, bebidas, garotas e Rock & Roll. Não posso considerá-los amigos, mas como eles eram excluídos da sociedade "comum", assim como eu, firmamos um pacto de respeito mútuo. Desde então minha casa nunca mais foi roubada (exceto por um amigo do meu irmão, que conhecia o pessoal que eu conhecia, mas que eu não ia com a cara... e não foi por falta de aviso.).
    Com isso ganhei mais uma qualidade, o respeito por pessoas de qualquer classe social, pois sei como a vida deles é dura, tanto em questões econômicas quanto sociais.

  5. Juventude - Júbilo

  6. Aos 17 anos, por não conseguir passar de primeira no vestibular, saí da casa dos meus pais para fazer cursinho em São Carlos.
    Em termos sociais posso afirmar com toda certeza que foi a melhor coisa que me aconteceu, pois estava em um ambiente diferente, com pessoas que não me conheciam, não sabiam dos meus estigmas e portanto eram amigos em potencial.
    Além disso, por morar sozinho (na verdade com mais duas outras pessoas, meu primo Samuca e com o André um cara que tinha acabado de entrar na faculdade) ganhei a liberdade que sempre quis ter.
    Como fiquei pouco tempo em São Carlos nessa época fiz poucas amizades, porém duradouras, pois até hoje eu mantenho contato com alguns amigos dessa época.
    Três meses após sair da casa de meus pais passei no vestibular na Universidade Federal de Uberlândia, onde cursei Ciência da Computação e, como em São Carlos, Uberlândia era um ambiente desconhecido.
    Como meus veteranos não deram trote na nossa turma, não conhecia ninguém, por isso, logo no meu primeiro semestre entrei na organização de um evento promovido pelo departamento, o qual me fez conhecer diversos professores e veteranos do curso, levando, futuramente, a boas amizades.
    Após o evento fui buscar novos horizontes para conhecer pessoas, foi quando entrei para o Diretório Acadêmico do curso, enfiando, de vez, o pé no movimento estudantil, conhecendo pessoas de outros cursos, dentre os quais, meus melhores amigos estavam nos cursos de economia, história, letras, filosofia, artes, música e geografia.
    Além de fazer amigos (os quais digo, atualmente, que são amigos para a vida) através do movimento estudantil, fiz vários amigos através do RPG, dentre os quais, a partir de um amigo, o Nelson, economista já formado há tempos quando o conheci, fui conhecer aquele que, até hoje, é o meu melhor amigo, o Álvaro, Economista da UFU, trabalha no Laboratório de Informática do Centro de Pesquisas Econômicas e Sociais do Departamento de Economia da UFU (o que me rendia altas conversas com ele pois, quando tava de saco cheio de assistir aulas eu corria para a sala dele para bater papo), possui três programas de rádio na Rádio Universitária da UFU, sendo um de Jazz, um de Blues e, o melhor, o de Rock & Roll.
    Atualmente tudo o que sei sobre Rock, Jazz e Blues (além de um bom tanto sobre a vida) devo a esse ilustríssimo amigo, que não vejo a um ano.
    O fato curioso é que o Álvaro possui uns 20 anos a mais que eu, casado, com dois belos filhos e uma esposa que é um amor de pessoa. Fiz deles a minha segunda família, na verdade, mais que uma família, pois dentre eles o respeito era mútuo e não havia a questão moral de pais e filhos.
    Tive algumas namoradas, muitos casos, alguns bons, outros "conturbados", expandi minha cultura, ainda em proceso de expansão e tenho memórias que sei que jamais me arrependerei.
    Através dos amigos iniciais fiz vários outros e hoje, para quem passou infância e adolescência sem amigos reais, sei que a amizade é algo que ultrapassa barreiras interpessoais, sociais e psicológicas. Amigos são para a vida.

Para o próximo post, um pouco da minha vida Pós juventude e pré fase adulta, afinal, vocês já devem estar cansados de ler.